“Bobby Deerfield – Um momento, uma vida”, gravado em 1976. Estrelado por ninguém menos que Al Pacino, e seu dublê nas cenas de corrida, o piloto brasileiro José Carlos Pace. Que, tragicamente, perderia sua vida no ano seguinte, meses antes da estréia da película.

Bobby Deerfiled, a rigor, não deve ser considerado um filme sobre corridas, mas antes uma história de pretensões dramáticas ambientada nelas. De fato, seria mais preciso afirmar que o filme trata da morte, e das várias formas de se relacionar com ela – e talvez apenas por isso tenha sido ambientado em torno dos sangrentos GPs em meados dos anos setenta.

Logo na primeira sequência com corridas, por exemplo, ocorre um acidente fatal. O piloto em questão foi Carlos Reutemann – o pobre argentino provando que a arte imita a vida, quando o assunto é azar. Claro que o nome foi trocado, mas a indumentária estava lá, e tinha como intuito trazer a foice para perto do personagem principal logo de cara. Reutemann, afinal, era companheiro de Pace no início de 76, e a similaridade de equipamento leva o personagem de Al Pacino a querer investigar, por conta própria, as causas do acidente.

Suspeitando que algum animal pudesse ter invadido a pista, Deerfield visita no hospital um piloto que sobreviveu à mesma batida, e lá acaba conhecendo Lilian, a mulher pela qual irá se encantar ao longo da trama.

A um só tempo interessada e incomodada pela relação de proximidade mantida entre pilotos e a finitude da vida, Lilian jamais deixa o tema ser esquecido. Até que, por fim, é revelado que ela própria sofre de uma doença terminal, e tem muito pouco tempo de vida. Ao saber disso, Deerfield fala sobre a forma como a morte de um cão o traumatizou na infância, levando-o a não pensar muito sobre o assunto. E, como se não houvesse referências suficientes, o próprio irmão do piloto chega a perguntar se ele gostaria de ser informado quando sua mãe viesse a falecer.

As cenas de corrida não devem somar mais do que seis ou sete minutos, em dois momentos principais ao longo da trama. As que foram produzidas não passam lá muita credibilidade, especialmente quando envolvem batidas. Já as demais são bastante preciosas, tanto pelo que mostram de corridas reais, como pelos bastidores das mesmas. Emerson, Mario, Peterson, Pryce, Depailler, Hunt… Todos estão lá, paramentados ou não. E, claro, acima de todos está José Carlos Pace.

Mas… Por que Moco?

Bom, o destaque absoluto para a Brabham, claro, se deve ao faro de Bernie Eclestone, que rapidamente tratou de fechar um acordo paralelo com os produtores para ter mais visibilidade na obra. Ainda assim, permanece um mistério o motivo que levou a produção a utilizar capacete e macacão pertencentes a Pace, enquanto Reutemann era condenado a queimar vivo logo nos primeiros momentos da história.

Quem certamente comemorou muito a opção foi a Brahma, patrocinadora pessoal do brasileiro, que acabou tendo sua marca mostrada diversas vezes. Se a empresa chegou a pagar alguma quantia que tenha justificado a opção por Moco é algo que nunca cheguei a saber, mas é bem possível. Afinal, a Seiko conseguiu inserir nada menos que um comercial de seus relógios em meio ao filme, protagonizado justamente pelo grande astro das pistas, Bobby Deerfield.

Por dinheiro ou por acaso, o fato é que o filme oferece raras imagens onboard da pilotagem de Pace, ainda que obviamente gravadas em baixas velocidades. Além disso, é possível ver ao menos um pôster da grande vitória do brasileiro em Interlagos, além de diversas tomadas de sua tocada inspirada ao longo de alguns GPs daquela temporada.

O filme explica também por que Moco teve uma bandeira estadunidense pintada na asa de seu Brabham no GP da África do Sul de 1976, no lugar da tradicional flâmula verde e amarela. Tudo, claro, em nome do espetáculo.

Em termos de continuidade, o filme chega a ser grotesco. Reutemann, por exemplo, aparece em diversas cenas de corridas, mesmo após ter sua morte decretada logo no início do filme. Noutra vez, uma largada é simulada com uma falsa 1ª fila dominada pela Brabham, antes que a edição corte para a largada do GP da Espanha com Lauda e Hunt na ponta…

Mas, a despeito de tantos problemas, Bobby Deerfield acaba sendo um filme obrigatório para quem curte corridas no Brasil. Graças a ele o nome de José Carlos Pace tem registro no site mais importante de cinema em toda a net, o Imdb, e também graças a ele ainda existe algum registro audiovisual da condução do brasileiro, a partir do interior do próprio carro. E como se nada disso bastasse, ora bolas, estamos aqui falando de uma obra de Hollywood na qual ninguém menos que Al Pacino se travestiu de piloto, e o fez com a imagem do saudoso Moco. Somente isso, a meu ver, já torna qualquer filme digno de ser visto.

Se em última análise esta não é nenhuma obra-prima do cinema, nem tampouco se aproxima em interesse ao roteiro real que se desenrolava enquanto o filme era produzido, ao menos Bobby Deerfield deve ajudar o aficionado a entrar no clima da F1 em 1976.
 


JOSÉ CARLOS PACE


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